quinta-feira, 23 de julho de 2009

Irritada

Ele me invadiu, era uma coisa que eu sentia percorrer cada canto de mim. Minhas entranhas eram tocadas da forma mais estúpida possível. Eu não sentia dores, mas sensações terríveis. Minha vontade era encolher até expelir aquilo tudo de mim. Sentia nervoso, um pouco maior do que aquele que se tem quando alguém arranha as unhas num quadro negro. Mas enfim, tudo acabou. Ele foi embora e minhas mãos se desprenderam. Senti um alívio que era rapidamente interrompido pela lembrança daquela invasão. E minhas expressões foram se soltando aos poucos, tentando esquecer. Mas dentro de mim tudo ainda se revirava, não havia ordem possível a ser estabelecida no meu corpo e nos meus movimentos, desde os mais internos. Estava tudo irritado. Agora passou, estou salva de qualquer perigo. É apenas uma irritação.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Angústia

Todos os dias sinto como se a vida tivesse por um triz. E isso não é pessimismo, mas sim a realidade da vida. Não se sabe o que virá na próxima esquina e, diante disso, de nada adiantam os grandes e longos planos. E então, com esse sentimento de alguém que não sabe o que esperar, me proponho à intensidade, à descoberta de mim. Nas noites, nas rodas de amigos, entre bêbados desconhecidos, com a família e sozinha na multidão, essa minha sensação move minha necessidade de viver, de conhecer, de me permitir. E tendo um pouco de clareza disso, de onde vem toda a minha fugacidade, só uma coisa eu quero: no dia que o "triz" não existir mais e não houver mais nada para esperar, quero morrer feliz da vida! Quero sempre, nessa luta pelo o que quase se quebra, a lucidez da minha inconsciência. E por isso, no fundo, nem sei o que isso tudo significa - e nem quero saber.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Homenagem a Mirandão

"Era sempre assim, em cada um de seus frequentes pileques. Primeiro tinha aquela fase de esfuziante júbilo. Parecia-lhe o mundo perfeito e bom, a vida alegre e fácil, e naquela hora Mirandão tudo podia compreender e estimar, estabelecia-se entre ele e as demais criaturas um clima de comunhão total, mesmo entre ele e a fedida arraia-mijona, sua vizinha de cadeira. Ficava delicado, conversador, a imaginação extravasando, sem limites. A figura do estudante pobre, 'perpétuo estudante e perpetuamente sequioso', imagem por ele criada e da qual vivia, cedia lugar ao homem moço, importante e vitorioso, promovido a engenheiro-agrônomo, quando não a livre-docente da Escola, enumerando vantagens, galgando cargos e conquistando mulheres. Danava-se a contar histórias, e como as contava! Era um mestre da narrativa oral, criador de tipos e de suspense, um clássico da boa prosa.
Se a bebedeira prolongava, no entanto, ao fim da noite esse otimismo e essa euforia se esfumavam e, ao término da esbórnia, envolvia-se Mirandão em lástima e lamento, a flagelar-se, lancinante, em impiedosa auto-crítica, recordando a esposa vítima de sua degradação, os quatro filhos sem comida, toda a família ameaçada de despejo, e ele ali, nos antros de jogo e nos prostíbulos. 'Sou um miserável, um crápula, um canalha', alardeava Mirandão pungente, com remorsos e sem malícia, um moralista. Mas essa segunda e lamentosa fase só de raro acontecia, só em ocasiões de porres monumentais."

Salve a raridade dessa segunda fase e toda a canalhice jubilante de Mirandão!!!
Vivam os pileques do mundo!!! E o prazer do inconsciente!!!

(Mirandão é amigo de Vadinho, um dos maridos de Dona Flor.)

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Sem título

Pontos... Ponto e vírgula;
Exclamo a interrogação!
E interrogo a exclamação
Coloco til onde se quer acento
Junto tudo e esqueço o hí-fen
Cecidilha não existe
Sem regras por favor

Só para você!

Queria te escrever os versos mais bonitos, como se a beleza pudesse expressar o que eu sinto. E me engano. Nada de complexidades ou adereços, o sentimento é bem simples: é amor. E o amor é cafona! E ele será assim, ele se perde na nossa liberdade. Apaixonados pela vida vivemos a complementariedade inexplicável. A felicidade faz parte da meta principal, mais nada importa. Sermos felizes, livres e amantes é essencial. Ansiedades, fugacidade e solidão apenas fazem parte.